Olá pessoal, espero que todos estejam bem!
Vamos à nossa segunda indicação da série Leituras para a Quarentena e já esclareço que Verões Felizes não só merece entrar nesta como em qualquer lista de “obras mais bacanas dos quadrinhos”!
Só lembrando – caso você não tenha visto o post anterior – , as leituras aqui sugeridas em geral vão ter um caráter mais leve, mais positivista, para quem sabe alimentar nossa necessária esperança em dias melhores. E esta aqui, em especial, é uma obra que pode ser indicada para qualquer ser humano que queira se sentir bem!
É, inclusive, uma pedida muito interessante para aqueles que não gostam de histórias em quadrinhos.
Verões Felizes 1: Rumo Ao Sul é uma Graphic Novel curta, com apenas 64 páginas, lançada originalmente no mercado Franco-Belga em 2015 e que fez tanto sucesso que já gerou quatro sequências, tão deliciosas quanto a primeira.
Esta série da mega editora parisiense Dargaud, escrita pelo prolífico belga Zidrou, desenhada pelo espanhol Jordi Lafebre e com ótimas cores dele mesmo e de Mado Peña, não contém ação, terror, suspense, reviravoltas; não há um único tiro, nem cenas chocantes – e é exatamente aí que reside sua originalidade e frescor.
Verões Felizes retrata o cotidiano de uma família classe média belga em seus momentos de férias de verão, quando costumam se dirigir ao sul da Europa, em busca de calor e do mar. No caminho, há sim uma leve dose de aventura, mas totalmente “pé no chão”, com uma mistura de humor e drama, onde conheceremos os sonhos e as frustrações dos personagens – ou seja, exatamente como na maioria das famílias do mundo – ou pelo menos entre aquelas de estilo de vida ocidentalizado, talvez?
Vejamos: Pedro, o pai, é um espanhol que vive na Bélgica e desenha histórias em quadrinhos, produzindo arduamente para outros mas que também tem criações autorais, embora sem nenhum sucesso. Sua esposa, Madô, é vendedora infeliz em uma loja de sapatos. Louis, o único garoto, é um leitor compulsivo de quadrinhos do Lucky Luke e conversa com um amigo imaginário. As duas irmãs mais velhas, Nicole e Julie, vivem discutindo por qualquer coisinha, mas adoram batatas fritas com maionese, enquanto a caçulinha e fofa Paulette está ainda aprendendo as palavras e, principalmente por isso, é responsável por algumas das cenas mais despretensiosamente engraçadas.
Com texto ágil e desenhos bem bonitos, é uma leitura rápida, prazerosa e que suscita doces memórias.
Aliás, esse é um ponto importante.
Como disse, acho que todos os públicos podem curtir mas, imagino que, quanto mais velho o leitor, mais poderá apreciar a obra, simplesmente porque terá um maior volume de emoções despertadas.
Isso porque a HQ é pura nostalgia.
Como a abordagem de Zidrou remete a uma forma de passar o verão em família, o quadrinho traz basicamente dois pontos de vista: do casal e das crianças. Assim, se você já for um pai ou uma mãe, portanto, vai conseguir resgatar suas memórias da infância e, ao mesmo tempo, poderá se identificar também com a visão das férias dos adultos.
Os passeios da família Faldérault são por cenários da Europa Ocidental e Mediterrânea – claro, um pouco diferentes dos nossos – , mas o “espírito” é o mesmo: se lá eles curtem banhos em rios, piqueniques na beira de lagos ou no quintal de alguém, além de paradas em campings estratégicos, seria o equivalente (ao menos para muita gente aqui do estado de São Paulo) aos passeios pelo litoral ou aquela temporada na chácara ou no sítio de um tio ou avô no interior.
Como estou na casa dos 40 anos, casado e com filhos, “me projetei” muitas vezes no entusiasmo das crianças, em geral alheias aos problemas dos adultos.
Meus verões da infância foram particularmente marcados pelos dias e noites quentes de Caraguatatuba, com primos, avós, tios e muito sorvete, banho de mar, castelos na areia, idas ao parque de diversões e passeios no calçadão. Ler Verões Felizes é mesmo uma deliciosa viagem ao melhor do passado.
Interessante que a HQ parte de um argumento simples, mas sua realização não tem nada de simplória: o cotidiano é retratado de maneira bela, delicada. O roteiro e a arte trazem cuidados sutis na construção das personalidades de cada membro da família, com destaque para a difícil tarefa de distinguir, de tornar única, cada uma das crianças.
Zidrou foi professor e certamente sua experiência prévia o ajudou nisso. A propósito, o roteirista hoje vive exclusivamente de seus textos para quadrinhos, tendo acumulado uma vasta produção exatamente para crianças e adolescentes e, só mais recentemente, álbuns também para adultos. Esse histórico me instigou a procurar outros trabalhos do belga.
E os desenhos? Impossível pensar em outro artista para retratar esta simpática família. Jordi é um espanhol que também teve experiência com literatura infantil e é professor de arte. Capaz de muita leveza e com uma narrativa fluida, seu ponto forte, sem dúvida, é a expressividade que consegue imprimir em todos os personagens e, certamente, a capacidade de fazê-los “gente como a gente”.
Verões Felizes é publicado pela SESI-SP Editora, com tradução de Fernando Paz, e no Brasil foram lançados os três primeiros Álbuns:
1. Rumo ao Sul é sobre o Verão de 1973.
2. A Calanque, sobre o Verão de 1969.
3. A Senhorita Estérel, sobre o Verão de 1962.
Cada álbum pode ser lido de maneira independente mas, na medida do possível, sugiro pegar a primeira edição. Por não ser capa dura e ter várias reimpressões é fácil encontrar com bons descontos nas livrarias virtuais. Prefiro comprar meus quadrinhos e livros no mundo real mas, como estamos em quarentena, essa é a única opção no momento.
Se puderem, procurem livrarias e comic shops independentes. É legal dar uma força para os pequenos, ainda mais agora!